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Marafações de uma Louletana

Blog sobre Loulé e as suas gentes

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Marafações de uma Louletana

23
Ago11

A época do varejo

Lígia Laginha

 

 

Outrora principal actividade económica do interior algarvio, a cultura dos frutos secos, com destaque para a alfarroba, para a amêndoa e para o figo, continua a ser um dos símbolos do Algarve. Ainda que já poucos se dediquem ao trabalho no campo, chegado o mês de Agosto pode ouvir-se o som do varejo (assim se chama no Algarve a apanha dos frutos secos) um pouco por toda a terra marafada. O varejo é um trabalho duro, não tão duro como no passado devido às melhorias em termos de transporte dos frutos desde do local da apanha até ao sitio onde serão armazenados, e marcadamente manual.

Para o varejo convêm ir logo de manhã bem cedinho, pois a essa hora o calor ainda não aperta, e levar uma bucha, ou seja, uma espécie de lanche que pode consistir num bocado de pão, azeitonas, peixe frito ou toucinho e é consumido quando se faz uma pequena pausa no trabalho. A bucha é geralmente uma altura de convivio entre aqueles que "andam à alfarroba". 

 

Mas afinal o que é o varejo?


O varejo ou apanha dos frutos secos é feito como uma vara bem comprida, de madeira ou de cana, que é utilizada para sacudir os ramos das árvores (varejar) e fazer cair os frutos das mesmas. Os frutos caem no chão, previamente limpo (nós dizemos “arraspar as farrobeiras”), ou então sobre toldos, isto é, panos que são colocados no chão antes de começar a varejar.

Depois de apanhados, os frutos são transportados em alcofas de empreita até aos recipientes próprios onde ficarão armazenados. No caso das alfarrobas e das amêndoas esses recipientes são sacas de linho ou serapilheira, no caso dos figos usam-se canastras grandes de vime e cana.

Para transportar os frutos desde da terra até casa utilizam-se maioritariamente tractores agrícolas, contudo, antigamente, na falta destes transportes, recorria-se aos burros e às mulas.

Chegadas a casa do agricultor, as alfarrobas são guardadas tal qual como se encontram, isto é, ensacadas, já as amêndoas têm de ser descascadas, ou seja, é-lhes retirada a casta externa e depois são colocadas ao sol. Os figos, na sua maioria, são igualmente colocados ao sol sobre esteiras de cana. No passado as pessoas reservavam um sítio próprio no quintal para colocar as esteiras com os figos, a este sítio chamava-se “almenchar”.

Futuramente estes frutos secos, sobretudo a alfarroba, são vendidos a comerciantes que pagam um determinado valor por cada arroba (15 quilos).

Dantes considerava-se o dia 29 de Setembro, dia de São Miguel, como o dia oficial em que terminava o “varejo” e se iniciava o chamado “rabisco”. O rabisco era uma época em que se considerava que os frutos ainda presentes nas árvores já não seriam colhidos pelos seus proprietários e por isso qualquer pessoa o podia fazer.

E é isto o varejo: Uma marca das gentes marafadas que nos dias mais quentes de Verão açoitam as alfarrobeiras e fazem o negro fruto cair no chão.

 

Nota:

 

1. Na imagem podemos ver alguns dos utensílios do varejo como são a vara, os toldos ou panos, as sacas e a alcofa.